Liberdade religiosa: Testemunhas de Jeová podem recusar transfusão de sangue em tratamentos médicos

Jurista do CEUB avalia maior segurança jurídica para condutas médicas. SUS oferecerá tratamentos alternativos

Liberdade religiosa versus dilemas médicos em pauta. Na última terça-feira (25), o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu decisão histórica ao julgar a possibilidade de pessoas, especificamente as Testemunhas de Jeová, se recusarem a fazer procedimentos médicos que envolvam transfusão de sangue. Daniella Torres, especialista em Direito Médico e professora do Centro Universitário de Brasília (CEUB), analisa a decisão e comenta a relevância do julgamento para a atuação dos profissionais de saúde do Brasil. 

De acordo com a especialista, a ausência de um posicionamento claro do STF deixava os médicos em uma situação delicada, quando era necessário escolher entre respeitar a liberdade religiosa do paciente ou seguir o Código de Ética Médica, que obriga o profissional a preservar a vida a todo custo. “Essa falta de clareza jurídica colocava o médico em uma posição de vulnerabilidade em seu exercício, sujeito a responder tanto por respeitar quanto por desconsiderar a liberdade religiosa do paciente”, ressalta Daniella.

Com a decisão do STF, fica evidente que a liberdade religiosa da pessoa adulta e mentalmente capaz deve prevalecer, permitindo que recuse a transfusão de sangue. No entanto, a docente do CEUB alerta que há ressalvas: “É importante destacar que esta decisão não se aplica a menores de idade, nos quais a responsabilidade pela autorização de procedimentos médicos permanece com o profissional de saúde, que deverá agir de acordo com o melhor interesse da criança ou adolescente”.

De acordo com os ministros do STF, a decisão segue princípios constitucionais previstos no artigo 5º da Constituição Federal, que assegura direitos e garantias fundamentais, como a dignidade da pessoa humana e a liberdade religiosa. “O Supremo entendeu que o direito à vida e à saúde deve coexistir com a liberdade religiosa, mas que a vontade do paciente deve ser respeitada, desde que ele seja maior de idade e esteja mentalmente capaz”, esclarece.

Como encaminhamento, a decisão também garante que, caso o praticante de Testemunha de Jeová se recuse a receber a transfusão, o Sistema Único de Saúde (SUS) deverá disponibilizar tratamentos alternativos, quando existentes, sem custo adicional para o paciente, explica a professora. “O ônus de custear esses tratamentos recairá sobre o Estado, garantindo que o paciente tenha acesso a cuidados que respeitem suas convicções religiosas.”

Mesmo com as diretrizes na condução de casos envolvendo a recusa de procedimentos médicos por motivos religiosos, a docente do CEUB alerta para a necessidade de mais discussões sobre a aplicação prática dessa decisão no dia a dia dos profissionais de saúde. “Isso representa um avanço na proteção dos direitos individuais, mas também exige uma atualização nos protocolos e treinamentos dos profissionais de saúde para lidar com essas situações de maneira adequada e humanizada”, conclui a especialista.